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NUMA ESQUINA DO BIXIGA

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Sábado, tarde ensolarada. Tempo bom para correspondências. Quem escreve cartas hoje em dia? Eu vi a mesmice do mundo, ela começa numa sórdida esquina do Bixiga. Quanta beleza e imperfeição. Perdição, o mundo está carente de perdição. E quem precisa de mais feriados? Eu não. Eu escrevo. Animal em extinção. O maior escritor do Brasil é um loser. Aos sábados, ele engole uma feijoada e vai dormir. Mas ele logo retorna. Resiste. Literatura é sina, maldição. Tragam-lhe mais um copo de vinho, coloquem a cerveja no refrigerador. Vamos brindar ao enfant terrible. Aos órfãos das letras. Aos parceiros de metáforas. Mais um feriado perdido. A tarde derradeira se esvai e as palavras, preciosas e inúteis, se amontoam num caótico caderno de notas. Quem se preocupa em fazer literatura, essa dispersa filosofia, passatempo para 300 anciões? Ah, o crepúsculo usurpa nossas convicções. Os sábados inspiram uma doce autocomiseração. Mas não devemos nos abater. Há uma gota de sangue em cada palavra. A mão q

SUOR LITERÁRIO

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 Um retrato do Brasil que trabalha e sonha na obra de Giovana Madalosso e José Falero* “O Brasil só enxerga a periferia como fonte de mão-de-obra barata." Cometida em uma recente entrevista, a frase acima é de Ferréz, autor que sabe muito bem o que significa ser invisível e estar apartado de um mundo de oportunidades, sejam elas econômicas, sociais ou culturais. A literatura dele e de outros escritores que vivem nos capões e comunidades periféricas persiste a duras penas, mas é sempre intensa e entusiasmada na sua luta pela sobrevivência num Brasil onde as desigualdades se acirram, onde anda falando o básico pra uma parcela cada vez maior da população. Nesse universo marginal, a poesia é um luxo para muito trabalhador. Quando há ânimo para algo além da dura rotina, melhorar de vida é pensamento muito mais recorrente entre assalariados que precisam atravessar a cidade para ganhar o sustento no país paralelo dos mais afortunados. Os que sonham podem e

ESSA LENGA LENGA DE DAVID COPPERFIELD

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A família Glass é uma criação de um dos meus escritores favoritos, J.D. Salinger. Os Glass são geniais, excêntricos, sofisticados. Em Seymour: Uma Introdução , Buddy, o caçula, pede um livro de presente para o irmão, mas alerta: precisa ser um romance de autor que comece com a letra E, pois até a letra D ele já havia esgotado tudo o que havia para ler. Precoce o menino, não? Lembro sempre dessa passagem quando o assunto são as obras e autores que já li. Não foram muitos como o tal do Buddy Glass, bem menos do que desejaria ter lido. Mas eles estão todos aqui comigo e carregam histórias e aprendizados de uma vida. Bem, quase todos. Alguns empréstimos nunca foram saldados pelos amigos, e eu devo ter aqui também pelo menos uma dúzia de livros que foram incorporados na surdina à minha biblioteca pessoal. O acervo está bem guardado – e periodicamente inspecionado. Tempos atrás, telhado quase em ruínas, a casa da família sofreu uma reforma. Por algum motivo insondável, no intervalo de